Por Isabela Junqueira
Foto de abertura: divulgação
A partir da estética que começou a ser traçada de forma prematura — mais precisamente quando a profissão de designer digital ainda nem existia — o traço criativo de Henrique Ricardi era formulado. A partir das vivências que experienciou ao longo da vida, Henrique encontrou uma forma de canalizá-las, gerando algo completamente novo a partir da singular confluência, sendo um dos criativos que deu vida ao coletivo HOOD.
Diante do contato com o universo do skate, a prática e o envolvimento com a esfera do hip-hop através do contato direto com o rap, DJs, grafiteiros e b-boys, Henrique passava por um processo de absorver essas referências — o que anos depois se refletiria pontualmente em seu trabalho. A inclusão no mercado fashion também influenciou vigorosamente o artista, que a partir desse contraste de mundos, despertou um olhar preciso e crítico.
Foto: divulgação
O grande fornecedor de referências para Ricardi são suas próprias vivências, o que gera uma autonomia díspar para gerar obras que fogem totalmente do habitual, conduzindo o artista a transformar organicamente o hobbie em profissão.
Com a liberdade para ousar e estética urbana completamente singular constituída, naturalmente Henrique Ricardi também atraiu os olhos da indústria fonográfica para suas criações. O designer chacoalhou principalmente o nicho da música eletrônica em projetos como o lyric video para “Body on My Mind” de Alok, artworks para Chemical Surf, KVSH, Liu, Slow Motion, Tropkillaz, além de videoclipe para Victor Lou e Gommez, em “Take Down”.
Com trajetória cada vez mais sólida e consequentemente propícia para alçar voos mais altos, o designer busca ultrapassar esferas específicas abrindo seu leque de atuação para incontáveis possibilidades — disposto a colaborar com marcas de diferentes nichos. Sem apegos aos moldes tradicionais, o pilar que sustenta a ânsia artística de Henrique Ricardi é, certamente, desafiar-se a ousar.
HM – Oi Henrique, é um prazer! O contexto familiar de incontáveis artistas não colabora para sua ascensão. Na verdade, na maioria das vezes, a profissão é bem marginalizada, não é? E no seu caso, é curioso porque sua família foi essencial para o seu avanço como artista. Como você interpreta esse processo?
Sem dúvidas! Acredito que o contrário (da minha experiência) seja mais comum pela frequência em que o mundo funciona hoje. Fomos condicionados a acreditar que só há um caminho (escola, faculdade, trabalho e aposentadoria) justamente pelo fato das profissões informais serem tão marginalizadas e incertas.
Antes de me estabelecer como designer gráfico, tive diversas tentativas de projetos que falharam, e não tenho dúvidas de que o incentivo que recebi da minha família foi extremamente importante para que eu continuasse tentando seguir meus sonhos, portanto, sou muito grato por isso.
HM – O hip-hop nacional, seja antigamente ou nos dias atuais, goza de um espectro que (orgulhosamente) só aumenta, mas é claro que existem artistas ou grupos em específico que tendemos a desenvolver um apreço especial. Quais são os seus e qual sua primeira lembrança em relação a eles?
A primeira lembrança que me vem em mente em relação ao rap é a música “Sr. Tempo Bom”, do Thaíde e DJ Hum. Esse som rolou nos anos 90, eu era criança e lembro que adorava quando tocava no rádio. Há diversos rappers e grupos dos quais tenho um grande apreço, porém, entre todos eles, posso citar o Djonga e, obviamente, o grupo Racionais MCs, ambos pelo impacto causado em mim no primeiro contato que tive com suas músicas. O que mais me chamou atenção foi a maneira incisiva que tratam assuntos tão delicados e polêmicos, como a desigualdade e o preconceito racial/social.
HM – E de que forma você sente que a HOOD colaborou pro seu desenvolvimento artístico?
Após a criação da HOOD, trabalhei com inúmeros artistas e gravadoras que me deram liberdade para criar e, por consequência disso, passei a acreditar cada vez mais em mim. Não tenho dúvidas de que isso ajudou a evoluir consideravelmente a qualidade de meus trabalhos.
Foto: divulgação
HM – E uma pergunta que não quer calar: se você não fosse designer, o que você acredita que teria como profissão?
Tenho alguns projetos além da HOOD e todos eles estão diretamente conectados ao meu lado criativo, portanto, acredito que seria algo nesse sentido, seja através de estampas, telas ou melodias.
HM – Você tem um baita envolvimento com a moda, uma esfera que dia após dia se abre as possibilidades contemporâneas. Acho que uma das referências mais latentes da mistura design + moda da atualidade é o japonês Takashi Murakami. O trabalho dele está presente desde em capas de álbuns (como do Kanye West) até a mais recente parceria com a água Perrier, em que ele estampou as garrafas. Você busca essa ampliação para o se trabalho, é uma das suas metas?
Com certeza! Ao meu ver, colaborações como essas abrem um amplo leque de oportunidades para as criações de um artista visual. Não vejo a hora de poder realizar o meu primeiro trabalho com alguma marca.
HM – Seu slogan é “igual, mas diferente”, então nada mais válido te perguntar: o que seria diferente?
Cada pessoa tem suas próprias histórias, experiências, dores, alegrias, etc, e é isso que nos torna indivíduos. Não há ninguém igual a você, ou igual a mim.
Toda mente criativa replica algo que já foi citado e/ou representado em algum momento. É fato que o mundo muda com o passar do tempo, mas, a arte permanece com sua essência intacta. Mesmo que, em alguns casos, retratamos algo concreto ou atual, continuamos falando sobre as mesmas coisas de sempre: sensações e sentimentos.
Enfim, digo falo ‘igual, mas diferente’, significa que crio o que já foi retratado anteriormente, porém, sob meu ponto de vista, a partir de tudo aquilo que já vi e vivi. Tento deixar um pouco de mim em tudo que faço.
HM – Indica para quem está lendo essa entrevista um filme, uma série, um álbum e duas músicas (uma para animar em um dia triste e outra para um momento feliz).
Um filme: “O Jogo da Imitação”
Uma série: “Californication”
Um álbum: “From The Cradle”, do Eric Clapton
Duas músicas: Para animar em um dia triste, eu escolheria Charlie Brown Jr., “O Preço” e, para um momento feliz, eu diria que a minha escolha seria Jet, “Are You Gonna Be My Girl”
HM – E por fim: como você mantém a sua criatividade tão aflorada em um mundo que muitas vezes pode ser tão cruel com artistas? Valeu pelo papo, Henrique!
Criar é o que me faz me sentir vivo, portanto, tento manter uma vida com hábitos saudáveis para estar com o corpo e mente em equilíbrio e assim conseguir produzir da melhor forma possível. Em relação ao lado criativo, não existe nenhuma fórmula, qualquer coisa pode servir de inspiração. Desde um filme, uma música, os muros ou até uma cor. Vão vivê! [rs]
Obrigado pelo espaço, gente!