Por Gábi Loschi
2023! Ano em que as pessoas finalmente voltaram a se divertir na pista sem preocupações, sem medo do COVID, sem hora pra ir embora, e sem poder reclamar da variedade de eventos e artistas no Brasil todos os meses. Do mainstream ao underground, está lindo de ver e se viver!
Precisávamos tanto disso, após sermos o primeiro setor a parar em 2020 e o último a voltar em 2022. Mas não significa que o ecossistema esteja balanceado para todos. Em conversas com promotores e artistas, o que se comenta é que 2023 também tem sido um dos anos mais estranhos da música eletrônica brasileira. Se hoje estamos celebrando como se não houvesse amanhã, alguns arranhões ficaram.
De um lado temos uma cena potente atraindo milhares de pessoas para eventos sold outs como Tomorrowland e Afterlife. De outro, vemos centenas de eventos com dificuldades. Boa parte do público prefere guardar dinheiro para ir a grandes festivais do que frequentar eventos locais. Este é o tema do artigo “Bênção ou Carma”, de Victor Flosi. Então os jovens estão saindo menos?
Enquanto 80% deles frequenta grandes shows e eventos às vezes, somente 46% vão a casas noturnas. Pesquisa do DataFolha do final de 2022 em 12 capitais brasileiras, diz que 54% das pessoas entre 15 e 29 anos não frequentam mais clubes. Uma geração passou a adolescência sem a dance music nas pistas durante a pandemia, e o efeito disso é sentido nos rankings do país, hoje ocupados por gêneros que cresceram exponencialmente como o trap e o funk carioca, que se unem ao sertanejo e pop como as grandes tendências este ano.
A própria música eletrônica está mais melódica e orgânica, envolvendo elementos agradáveis para quem ouve música em casa, e não sempre nas pistas —a matéria sobre organic house do Bruno Bellato traz mais sobre o gênero que conquista o Brasil. Neste cenário, clubes como Gate 22, Caos, Laroc e Ame, que atraem multidões para a região metropolitana de Campinas-SP em todas as aberturas, despontam como grandes fomentadores da cultura clubber brasileira.
As pessoas buscam por experiências, comunidades, acolhimento, e quem conseguir entregar isso, e entender o comportamento da nova geração, aumenta suas chances de sucesso. No último South by Southwest (SXSW) em Austin-EUA, Rob Jonas, CEO da Luminate (inteligência de dados para indústria criativa), falou sobre as três principais tendências para o entretenimento:
- O TikTok: dois em cada três usuários Gen Z descobrem novas músicas pelo aplicativo.
- Fandoms: estão mais engajados do que nunca, e dispostos a gastar. 31% da geração Z deseja que seus artistas ofereçam mais opções de produtos para os fãs.
- Crescimento do streaming musical: “A globalização do conteúdo permite novos gêneros se expandirem e desafiarem estilos estabelecidos há décadas na indústria”.
Esse cenário afeta também os artistas. Se de um lado temos uma legião de brazucas representando a bandeira nacional no exterior como nunca antes visto, sendo desejados pela meca do mercado e ocupando os principais espaços da música eletrônica no mundo (tema retratado no artigo de Iasmim Guedes), por outro temos artistas consolidados com dificuldade em aumentar seu cachê é até em lotar suas agendas. Para quem está iniciando, existe uma janela de oportunidades, mas o caminho fácil não existe. Para ajudar artistas a se posicionarem, a Boreal Music Academy trouxe um passo a passo nesta edição.
E já que hoje a bandeira verde e amarela brilha lá fora, trouxemos para a capa um dos artistas melhor posicionados neste mercado, que está colhendo os frutos de muito trabalho e talento. Classmatic mostrou ao mundo a potência do tech house brasileiro, e conta em uma entrevista densa a trajetória que o levou a ocupar um lugar de destaque nos rankings e eventos mundiais. Ele representa o sonho de diversos brasileiros e, para acompanhar a matéria de capa, incluímos artistas e assuntos variados que mostram a pluralidade da cena eletrônica, e evidenciam o potencial que temos em nossas mãos.
Para ocuparmos lugares cada vez maiores na indústria musical, precisamos de união e de uma cena sustentável, onde a sobrevivência seja para a maioria, e não à minoria. Que artistas, agências, produtores de eventos, produtores de conteúdos e as mais diversas profissões do ecossistema, incluam a todos, grandes, pequenos, consolidados, emergentes, pois se queremos que o público frequente a cena por completo e não apenas os grandes eventos, precisamos dar o exemplo de dentro e também mostrar aquilo que vai além do óbvio e além das massas.
Que nossa cena seja cada vez mais inclusiva, e que todos tenham o espaço —e o sucesso— que merecem!