Por Marcela Moura
Foto de abertura: divulgação
A cultura club sempre caminhou lado a lado com a formação da cena da música eletrônica mundial.
É lá que, desde os DJs locais até os artistas conhecidos conseguem ter uma interação mais intimista com o público, experimentar novas tracks e lançar tendências, e onde os futuros produtores musicais descobrem sua paixão.
Sem os clubs, onde mais os grandes nomes começariam sua carreira?
O fenômeno mundial Mochakk publicou, recentemente, um tweet onde reitera a importância desses espaços, e seu carinho especial por se apresentar neles:
Desde sempre, o endereço R. Francisco Otaviano, 20, é referência na noite carioca. É lá que está localizado o Ava Club Rio, no subsolo do Hotel Fairmont, em Copacabana – bairro ícone da resistência da cultura clubber, onde boates como Bunker 94 e Fosfobox fizeram História.
A venue já teve diferentes nomes, como Dash e Cave, e atualmente se chama Ava. E também tem, por mérito, seu capítulo na tal História citada acima. Por lá passaram alguns dos grandes nomes da cena mundial, como Lee Foss, Phonique, Ellen Allien, Eelke Kleijn, Nastia, Anabel Englund e Richy Ahmed, dentre outros.
Em 12 anos de funcionamento, uma pessoa sempre esteve por trás de tudo: Felipe Cardias. E é com ele que conversaremos hoje.
Felipe Cardias, dono da Ava Club Rio. Foto: Acervo pessoal.
Antes de falar da Ava, precisamos contextualizar um pouco.
Desde a década de 80, era neste endereço que funcionava a Chez Castel, espaço que celebrou desde o aniversário de 26 anos de Cazuza à vinda de Frank Sinatra à Cidade Maravilhosa, com direito a 4 performances ao vivo do ícone. Isso mesmo, Mr. Blue Eyes se apresentou no local em 1980.
Frank Sinatra se apresentando no Chez Castel, Rio Palace Hotel, em 1980
Cazuza,Ney Matogrosso e Herbert Richers Jr no aniversário de 26 anos do Cazuza, na Boate Chez Castel no Rio de Janeiro, em Abril de 1984.
No final dos anos 90, mais especificamente em 1999, abriu-se as portas do Club B.A.S.E., e este foi o marco inicial da história do local na cena eletrônica brasileira.
-Felipe, conta um pouco sobre a trajetória da Ava, desde sua fundação.
Em 2012, assumi o espaço e fundei a Cave Club.
Ali foi onde eu entendi minha responsabilidade como fomentador cultural, abrindo a programação do meu club tanto aos DJs locais quanto a artistas consagrados que fizeram parte das origens do techno e house music.
Em parceria com os produtores Marcela Moura e James Cesari, lançamos a Cave Sessions. Essa label party provocou uma verdadeira revolução nas pistas. A resposta foi incrível!
Através dela, trouxemos algumas das maiores referências da cena para se apresentar em um club, com aquela vibe intimista, algo que raramente acontecia no Rio.
Trouxemos nomes como Phonique, Underground Resistance, Ellen Allien, Barem, Joyce Muniz, DJ Memê, Chemical Surf, Peter Hook (New Order), Lee Foss, Anabel Englund, e não podemos esquecer o festival Meca ou as after parties do RMC (Rio Music Conference, ou Rio Music Carnival, a partir de 2015).
Em 2018 me associei à Pamela Cancela, que trouxe um olhar ao público mais jovem e à crescente cena do EDM e tech house, onde começamos a criar mais um capítulo do nosso clubinho.
-Na sua opinião, qual a importância dos clubs para a construção da cena noturna?
Os clubs estão presentes no dia a dia (ou noite a noite, risos) do movimento. É lá onde nascem os novos djs e produtores musicais que um dia irão dominar os charts. É no club local que o artista famoso vai tocar aquele som que ele ouve em casa, não no festival. É no club que se lançam as novas tendências que irão ditar o som dos streamings e das grandes pistas dos festivais.
Os clubs educam musicalmente. É lá que cada um vai encontrar suas preferências, descobrir seu “nicho”.
E é lindo ver os novos públicos surgindo.
-Houve algum artista local atualmente relevante mundialmente que começou a carreira no club?
Sim, a primeira pessoa que me vem à mente é o Maz.
Antes de ser DJ ou produtor musical, Maz produziu uma das primeiras label parties da casa, com line up 100% nacional: Digitaria, que havia acabado de assinar com a Hot Creations, (label referência do Deep House, de Jamie Jones e Lee Foss), Flow&Zeo, Nana Torres e DJ Glen.
Pouco depois, Maz começou sua carreira como DJ, ainda como Thomaz Prado, nos nossos decks. E o resto é História, né… o mano voou e segue dominando os charts mundiais.
-Com a ascensão dos festivais e grandes eventos nos últimos anos, como o club conseguiu manter sua relevância?
Foi muito difícil, e ainda é um desafio. Hoje em dia quem faz evento sabe o risco que é, ainda mais trazendo atrações internacionais, pela alta do dólar e o surgimento de dezenas de festas e festivais para um público gigantesco, o que fez os cachês subirem muito.
Quase nenhum club sobreviveu. Nossa venue teve que se reinventar. Lançamos festas de rap, que trouxeram um novo público, com performances ao vivo de artistas brasileiros renomados como Lennon, Renan da Penha, etc. Por sorte, sempre valorizamos a “prata da casa”, os artistas locais. E foram eles os responsáveis por termos resistido.
-Qual foi a noite inesquecível que você produziu na casa? E qual o seu sonho de consumo para levar ao local?
A Cave Sessions com Lee Foss e Anabel Englund LIVE, sem dúvidas, foi uma noite para entrar para os livros. Eles estavam no auge, com a track “Reverse Skydiving”, e foi TODO MUNDO. Desde a galera do ‘underground’ até o público mais novo. Anabel fez os vocais live e a resposta do público, cantando junto, foi incrível … uma vibe indescritível.
Sonhos para o futuro? Se é pra sonhar… Peggy Gou, Jeff Mills e Black Coffee são alguns dos nomes que vem à mente.
-O que podemos esperar da Ava nos próximos meses?
A festa desta sexta, Boni & Friends, com o Gabriel Boni convidando artistas brasileiros renomados com certeza é uma de nossas apostas promissoras. Também estamos planejando novidades em breve. Aguardem!
Nesta sexta-feira, dia 16 de junho, Felipe comemora seu aniversário com o projeto Boni & Friends, que trará ainda Marian Flow e Underdogs, dando início a uma nova fase para a Ava, que promete muitas surpresas no segundo semestre de 2023. Ingressos aqui.
Os clubs possibilitam uma regularidade de consumo da música e cultura em um ambiente familiar. Uma identificação de cada público com seu espaço particular. Aquele evento X onde, toda semana, ou todo mês, você vai encontrar as “suas pessoas” e ouvir artistas com os quais você se identifica, que te fazem sentir “em casa”.
Frequente e valorize seu club local!